Nós, brasileiros, somos considerados passionais, e, por isso, muitas vezes entramos em discussões que são guiadas pela emoção e nos tiram do verdadeiro foco do debate. Um tema em que isso ocorre é a participação de mulheres em Conselhos de Administração. Estudos realizados tanto em nível local quanto global mostram que essa participação ainda é muito pequena, então resolvi escrever esse artigo para compartilhar dados e a minha visão. Espero poder ajudar muitas mulheres talentosas a alcançar esta posição.
“Women in the Boardroom – A Global Perspective”, pesquisa que a Deloitte realizou em março de 2022 envolvendo 7 mil organizações, indica que apenas 19,7% dos assentos dos Conselhos destas empresas são ocupados por mulheres. Esse resultado é 1,8 ponto percentual melhor que o estudo anterior, de 2019.
Foram listadas 44 nações, mas o Brasil só aparece na 37ª posição, com apenas 10,4% de participação de mulheres nos Conselhos. Houve uma evolução de 8,4% em relação à pesquisa anterior, mas os valores permanecem muito baixos.
Localmente, o Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC) também vem investigando o tema. Sua pesquisa mais recente, que contabilizou 6.160 entrevistas com profissionais de 389 empresas, concluiu que as mulheres ocupam 15,2% das cadeiras de Conselhos de Administração, posições de liderança e em comitês que assessoram os Conselhos. De acordo com essa pesquisa, 25% das empresas possuem mulheres atuando em cargos de direção e de conselho ao mesmo tempo.
Nas empresas familiares, ainda segundo dados da pesquisa do IBGC, a participação das mulheres nos Conselhos de Administração é de apenas 5%. Um projeto de lei aprovado recentemente pela Câmara dos Deputados reserva 30% das vagas de titulares de Conselhos de Administração de empresas públicas para mulheres. Resta agora ser aprovado no Senado.
Benefícios da Diversidade
A tese de que a composição dos Conselhos deve refletir a diversidade de gênero populacional ainda não saiu do papel. Mas minha participação em inúmeros Conselhos, seja como membro ativo ou organizando a governança de empresas familiares, tem me mostrado que a contribuição e participação delas nos Conselhos é de extrema relevância. A seguir, listo algumas das razões para isso:
- A maioria das mulheres que participam de Conselhos foram escolhidas por suas habilidades e competências funcionais e pela liderança diferenciada. Sabemos que são executivas que, para se destacar em suas áreas de atuação e chegar aonde chegaram, tiveram de enfrentar inúmeros desafios e preconceitos;
- Sabem exercer a escuta ativa, trazendo suas contribuições em momentos oportunos;
- Têm habilidade para entrar em discussões sobre temas delicados que precisam ser debatidos;
- São mais sensíveis às temáticas sociais e ambientais – e sabemos que a pauta ESG ganha cada vez mais importância nas empresas.
- Aportam a questão da diversidade aos debates do Conselho, contribuindo de forma efetiva para a qualidade das decisões. Um conselho homogêneo na forma de pensar não é eficaz: a diferença de pontos de vista enriquece o debate e leva a decisões mais satisfatórias.
- Representam e inspiram. Se na população a participação feminina é de 50%, certamente jovens talentos femininos terão mais interesse em trabalhar em empresas onde as mulheres ocupem todos os níveis, o que inclui o Conselho de Administração.
- Possuem aptidão para atuar com atração e retenção de talentos, podendo contribuir na criação e consolidação de políticas específicas nesta área. É um trunfo no cenário atual de alta competitividade.
Um estudo publicado pela Harvard Business Review a partir de análises realizadas por 163 empresas ao longo de 13 anos concluiu que aquelas que possuem mais mulheres em cargos de liderança estão mais abertas a mudanças, menos propensas a riscos e mais focadas em inovar. O estudo conclui que “há maior consciência de que os Conselhos com maior diversidade trazem melhores resultados, principalmente nesse ambiente em constante mudança que vivemos”.
Existem preconceitos nas empresas quanto à participação feminina nos Conselhos. Até mesmo nas empresas familiares as herdeiras se queixam de não terem o mesmo espaço para participar e atuar que os representantes masculinos.
Felizmente percebo a redução dessa resistência e muitas empresas já reconhecem e aplaudem a contribuição feminina nas decisões.
Sugestões para aumentar a participação feminina nos Conselhos
Listo abaixo iniciativas eficientes que tenho visto no meu dia a dia profissional atuando junto a empresas familiares, avaliando a atuação dos Conselhos e recomendando perfis específicos de conselheiros.
Para empresas:
- Criação de programas de mentoria para mulheres que desejam participar de Conselhos e/ou posições de liderança. Nos últimos anos criamos na CFEG um treinamento específico para liderança feminina que teve bons resultados;
- Flexibilização das jornadas de trabalho para conciliação da vida profissional e familiar.
Para as mulheres:
- Prepare-se, busque atualização em cursos e seminários;
- Desenvolva seu networking com mulheres que já estão nessas posições;
- Identifique empresas onde sua habilidade funcional pode ser útil. A entrada via participação em comitês pode ser uma boa opção;
- Ser conselheira é diferente de ser executiva – entenda as habilidades que a função requer.
Caso tenha dúvidas sobre este processo, fique à vontade para deixar sua pergunta aqui nos comentários. E se achar que a CFEG pode auxiliar sua empresa a pensar melhor o tema ou criar políticas, não hesite em nos chamar.
Autor:
JOÃO BOSCO SILVA
Consultor Sênior e Sócio – Cambridge Family Enterprise Group
Fundador da Bridge Business Advisors, que em 2017 se fundiu a Cambridge Family Enterprise Group para atender famílias brasileiras. Foi CEO da Votorantim Metais, em que liderou o processo de internacionalização e crescimento da empresa e participou do processo de transição da segunda para a terceira geração. Anteriormente, foi CEO da Alcan Alumínio do Brasil e trabalhou em montreal como Diretor de melhoria de desempenho para empresas da Alcan. Fez seu MBA no IMD, na suíça, e formou-se em engenharia metalúrgica pela escola de mineração de Ouro Preto.