As famílias empresárias enfrentam um cenário cada vez mais imprevisível. A complexidade dos desafios e riscos, aliada às transformações tecnológicas e sociais, exige uma nova abordagem para o desenvolvimento de sucessores. Não se trata mais apenas de preparar sucessores familiares para gerir o negócio tradicional da família, trata-se de formar lideranças com adaptabilidade, inteligência colaborativa e visão sistêmica.
A formação da nova geração precisa estar ancorada em valores. Estes são fundamentos que criam as bases para que os jovens de famílias empreendedoras enfrentem o futuro com autonomia, discernimento e propósito.
Segundo a Cambridge Family Enterprise Group, três fatores críticos sustentam a longevidade das famílias empresárias: crescimento patrimonial, desenvolvimento de talentos e união em torno de um propósito comum. Para atingir esses pilares, o envolvimento da Next Gen pode, e deve, ser estimulado para além do papel de gestores da empresa familiar. Desenvolver talentos com uma visão de portfolio de negócios – com o chapéu de “owner” – pode ser decisivo para garantir o crescimento do patrimônio e a continuidade do legado.
Que outros atributos seriam importantes desenvolver nos sucessores?
A Economia 5.0 – conceito que representa a próxima etapa da evolução econômica – exigirá talentos capazes de atuar em ambientes tecnologicamente avançados, mais centrados no ser humano, colaborativos e orientados à sustentabilidade. Competências digitais, aprendizagem contínua e visão interdisciplinar são algumas das capacidades fundamentais para lideranças que precisarão tomar decisões em contextos com múltiplas variáveis e riscos.
É provável que as empresas familiares evoluam para modelos de governança mais colaborativos, menos hierárquicos e com maior envolvimento de stakeholders, potencializando a inteligência coletiva. Podemos inclusive considerar formatos mais inovadores, como as empresas autogeridas propostas por Frederic Laloux em Reinventando as Organizações. Diante de tantas possibilidades, precisamos preparar os jovens não apenas para exercer a sua liberdade com responsabilidade, mas para lidar com cenários complexos e se manterem abertos à exploração de novas oportunidades de negócio. Modelos mais regenerativos e circulares devem se tornar predominantes, exigindo profissionais que combinem competências técnicas, humanas e éticas.
Nesse contexto, que oportunidades práticas podem ser criadas para envolver e desenvolver a nova geração? Será que o caminho tradicional — formar-se como gestor-operador do core business da família — será suficiente para prepará-los para os desafios futuros?
Um estudo de professores da MIT Sloan a respeito das motivações para famílias investirem em venture capital, destaca o empoderamento da próxima geração como um fator estratégico. Esse modelo sugere oportunidades de aprendizado através de investimentos em growth-stage businesses, negócios de impacto ou fundos de inovação, que podem simultaneamente educar sucessores, promover propósito e gerar valor.
Criar experiências reais que permitam à família alinhar performance financeira, inovação nos negócios e, quando possível, impacto positivo, representa um caminho promissor — sinalizando sofisticação estratégica e favorecendo o engajamento e o desenvolvimento da nova geração.
Outro ponto essencial é o papel da Now Gen. A geração que hoje lidera os negócios (Now Gen) e a governança familiar precisa criar condições objetivas para que os sucessores cresçam com suporte, clareza e protagonismo. O desenvolvimento deve ser orquestrado e precisa oferecer experiências consistentes, articuladas por pessoas que acompanham esse processo. Oportunidades em nichos menores — como sugere um estudo do MIT —, com mais autonomia, ou mesmo a participação como ouvintes em fóruns de governança, são estratégias que merecem ser consideradas.
Também é preciso reconhecer que a diversidade etária e o alinhamento multigeracional na governança podem ser ingredientes poderosos para o sucesso do processo sucessório. As turbulências podem vir do setor de atuação, do contexto político ou da complexidade de uma família que cresceu e não está estruturada para lidar com isto. A diversidade de perspectivas, experiências e formas de resolver problemas de forma criativa e eficaz pode gerar um verdadeiro bônus — para a empresa e para a família. O essencial é sempre fortalecer a união em torno de um propósito comum.
Ao escolher diversificar o portfólio de investimentos e envolver os sucessores em iniciativas que combinem retornos financeiros, inovação e impacto, famílias empresárias podem construir legados duradouros. Mesmo em tempos adversos, essas famílias podem assumir o protagonismo em uma nova economia — liderando com visão e promovendo transformações profundas não apenas em seus negócios, mas também na sociedade.
Famílias empresárias que compreendem isso e desenvolvem seus talentos para um mundo em transformação, não apenas aumentam suas chances de continuidade e preservação do legado, mas também se posicionam como protagonistas de uma economia mais inovadora, conectada e sustentável.