Tenho gostado muito deste mergulho que estou fazendo no tema do etarismo. Alguns achados são bastante frustrantes, mas por outro lado é importante pesquisar para poder engrossar o debate em busca de mudanças. Já escrevi dois artigos falando sobre o preconceito contra idosos, especialmente nas empresas, que você pode ler clicando aqui e aqui.

Em um deles, comentei os resultados do último censo do IBGE, que mostrou claramente que o segmento da população que mais cresce no Brasil é o de 50 anos em diante. O censo também apontou que graças a tecnologia e a melhor qualidade de vida, a longevidade está aumentando, assim como a vida útil no trabalho. Nos próximos anos provavelmente teremos de quatro a cinco gerações trabalhando concomitantemente nas empresas.

A sua empresa já pensou sobre isso? Está preparada para a nova composição da força de trabalho que virá?

Recentemente a Harvard Business Review publicou um interessante artigo em que os autores Catherine Collinson e Michael Hodin indicavam um roteiro para guiar as lideranças corporativas.

As estatísticas nos EUA são similares às do Brasil e também mostram as mesmas tendência de longevidade: aumento da população acima dos 55 anos, períodos de trabalho mais longos e, consequentemente, o adiamento do processo de aposentadoria.

Catherine lidera a entidade Transamerica Institute e a ONG Global Coalition on Aging, ambas dedicadas a estudar o envelhecimento. As recomendações abaixo vieram de uma pesquisa realizada pelo Transamerica Institute sobre as melhores práticas para a convivência intergeracional. Selecionei as que melhor se aplicam à nossa realidade.

1. Cultivar uma cultura de aprendizado permanente

Uma carreira de trabalho atualmente pode durar 40, 50, 60 ou mais anos, o que requer uma atualização permanente por meio de novos conhecimentos e aprendizado no trabalho (on the job experience).

Apesar desta realidade, o estudo aponta que apenas 54% dos empregadores colocam ênfase no crescimento profissional e desenvolvimento dos seus funcionários, incluindo os acima de 50 anos.

Somente 3 em cada 10 empresas oferecem treinamentos específicos com o objetivo de atender as diferenças multigeracionais. Estes programas têm como foco reduzir a discriminação por idade (28%), mentoria reversa entre mais experientes e jovens (23%), integração para novos contratados (23%), bolsas de estudo para educação continuada (21%) e grupos de trabalho multigeracionais (19%).

Nossas análises na Cambridge Family Enterprise Group (CFEG) indicam que as empresas familiares são mais rentáveis no médio/longo prazo do que as empresas não familiares, e uma das razões para isto é a transferência de conhecimento que acontece na passagem entre as gerações.

Nas empresas familiares existe uma grande oportunidade de criação de valor e transmissão de experiência dos funcionários mais seniores para os das novas gerações, e uma troca de aprendizado dos jovens com os antigos.

2. Facilitar o aumento do período trabalhado oferecendo planos de aposentadoria flexíveis

A pesquisa mostrou que 52% dos funcionários pretendem se aposentar depois dos 65 anos e muitos gostariam de ter um plano de aposentadoria flexível, uma prática pouco utilizada pelas empresas e que permite uma adaptação daqueles que vão se aposentar, reduzindo gradativamente sua carga de trabalho. Para a empresa, a passagem de conhecimento, atribuições e responsabilidades ocorre de uma forma mais fluida e natural. Este é um período em que o funcionário que está saindo pode atuar como mentor do seu substituto.

3. Oferecer programas de saúde, qualidade de vida e educação financeira para quem pretende se aposentar

Ajudar os trabalhadores de todas as idades a melhorar a sua saúde e bem-estar, a poupar para o futuro e a proteger as suas finanças é uma estratégia bastante valorizada pelos funcionários. Este tipo de benefício, já oferecido por algumas empresas, contribui para atrair e reter talentos.

Para que isso aconteça, me parece claro que empresas precisam de gestores de pessoas estratégicos

Mudanças de tendências e comportamento exigem uma nova postura dos gestores de pessoas, que precisam ter um perfil mais estratégico e menos operacional. Seguem abaixo algumas sugestões:

  • Se você é CEO ou membro do Conselho, coloque a função de gestão de pessoas vinculada ao nível mais alto da organização e promova pelo menos uma interação semestral com o Conselho de Administração. Os sinais são relevantes. Ao fazer isso você está sinalizando para toda organização a importância que a empresa dá às pessoas;
  • Qual o seu plano estratégico para os próximos anos? Que tipo de gestores e funcionários você vai precisar? Que habilidades sua empresa não tem e precisa trazer? Que conhecimentos atuais são valiosos e precisam ser mantidos?
  • Seu gestor de pessoas deve trazer tendências, revisar práticas obsoletas e ajustar suas ações ao plano estratégico;
  • Reveja o critério de limite de idade para o de idade funcional, como já comentei. Aqui na CFEG, quando abordamos criação de valor para famílias empresárias, também estamos falando do conhecimento construído ao longo dos anos.
  • Se você quer atrair os melhores talentos do mercado precisa cuidar da reputação. Cuide bem das suas equipes e estruture os processos de saída de forma justa, mostrando o reconhecimento da empresa à contribuição dada. Pessoas que dedicaram sua vida à empresa e saem satisfeitas são as melhores referências.

Há muito a fazer. Entendo, por exemplo, que existe uma grande oportunidade de criação de valor para as empresas que tiverem a perspicácia de formatar programas e oportunidades dirigidas a esta nova realidade de força de trabalho multigeracional. Uma possibilidade é oferecer ao colaborador que está em processo de transição rumo à aposentadoria um modelo de desaceleração sem desvalorizar sua expertise: num ano ele trabalha quatro dias por semana, no ano seguinte reduz a frequência para três dias por semana e assim sucessivamente. Neste período, ele pode desempenhar o papel de mentor do seu substituto, orientando sobre dúvidas específicas, e também assumir a responsabilidade de treinar e formar colaboradores recém-contratados.

Este é só um exemplo que me ocorre no momento. Tenho certeza de que as equipes de Gestão de Pessoas, ao se debruçarem sobre o tema, serão capazes de chegar a fórmulas interessantes. O tema está se tornando cada vez mais relevante e precisa estar na agenda das corporações que querem prosperar nas próximas décadas. A maioria parece ainda não ter percebido a importância de se preparar para gerir uma força de trabalho multigeracional.

Tenho muito interesse em continuar trocando ideias sobre etarismo no mundo corporativo. Se você tem alguma experiência – positiva ou negativa – com esse tema ou mesmo sugestão de leituras, mande aqui nos comentários.

 

 

JOÃO BOSCO SILVA
Consultor Sênior e Sócio – Cambridge Family Enterprise Group

 

Fundador da Bridge Business Advisors, que em 2017 se fundiu a Cambridge Family Enterprise Group para atender famílias brasileiras. Foi CEO da Votorantim Metais, em que liderou o processo de internacionalização e crescimento da empresa e participou do processo de transição da segunda para a terceira geração. Anteriormente, foi CEO da Alcan Alumínio do Brasil e trabalhou em Montreal como Diretor de melhoria de desempenho para empresas da Alcan. Fez seu MBA no IMD, na suíça, e formou-se em engenharia metalúrgica pela escola de mineração de Ouro Preto.