Dos muitos desafios comuns às empresas familiares, sucessão talvez seja um dos mais delicados.

Vital para a continuidade do empreendimento familiar, é preciso entender que a sucessão é um processo, que deve ser pensado e estruturado com base nos desafios futuros do negócio e acompanhado de muito perto.

Apesar da relevância do tema, o índice global de empresas familiares, da PWC*, mostrou que apenas 24% dos membros da geração atual no comando das empresas familiares brasileiras têm um plano de sucessão robusto.

A sucessão (seja no negócio, na família ou na propriedade), mexe com as diferentes perspectivas dos diferentes stakeholders, em especial do sucedido, sucessor, e demais membros da família, envolvendo expectativas individuais, relações familiares e muitos aspectos emocionais, conscientes ou não, inerentes ao ser humano.

O que tenho aprendido, ao longo desses 10 anos atuando com famílias empresárias, é que, muito embora exista um processo específico para que a transição seja realizada com sucesso, em cada família esse processo se dá de uma maneira diferente, ou seja, there is no one size fits all.

Outro importante aprendizado é que, paralelamente ao processo estabelecido, existe um importante trabalho de educação e quebra de paradigmas sobre o tema, imprescindível para o atingimento do objetivo final.

Gostaria de compartilhar 5 verdades que toda família deveria saber ao iniciar um processo sucessório:

1. Sucessão é um ato de generosidade, humildade e coragem.

O processo de sucessão exigirá que sucessor e sucedido atuem de maneira conjunta, com generosidade, humildade e coragem de ambos os lados – cabe à geração sênior a generosidade em passar seus conhecimentos, humildade em considerar novos pontos de vista e coragem para fazer acontecer; já para a geração mais nova, humildade para receber e buscar, ativamente, cada vez mais conhecimento, valorizando todo o legado construído e coragem para buscar legitimidade e construir novos ciclos de riqueza na família;

2. A sucessão envolve a transição de papéis em múltiplas dimensões.

Até um tempo atrás, a única forma de aproximação do empreendimento familiar era trabalhando em alguma posição executiva (quando isso era permitido), ou seja, ou as próximas gerações se viam trabalhando no negócio, ou se viam completamente apartadas de todo sistema.

Atualmente nós trabalhamos com diferentes possíveis papéis no empreendimento familiar, todos de suma importância, que devem ser considerados e que acabam por ampliar possibilidades e abarcar toda a diversidade da família;

3. O sucesso não está em conseguir replicar o modelo com outras pessoas nas funções.

O objetivo principal da sucessão não é substituir.

A sucessão é uma excelente maneira de revitalizar o sistema, devendo ser pensada com base nos desafios futuros do empreendimento familiar. Perguntas como: Onde queremos chegar? Que desafios encontraremos no caminho? Que competências precisaremos para tais objetivos e desafios? – nos ajudam, inclusive, a fazer as melhores escolhas.

4. A família deve preparar acionistas responsáveis, de maneira individual e coletiva.

Bons acionistas não nascem prontos, eles são preparados, e, quanto maior a família, maior a importância de se realizar um trabalho de maneira individual (trabalhando autoconhecimento, autoconfiança e fortalecimento das competências do acionista) e coletiva (aumentando o conhecimento do grupo, suas diferenças e complementariedades, fomentando a união, a colaboração, e já exercitando a tomada de decisão conjunta).

É imprescindível que as próximas gerações sejam preparadas como acionistas responsáveis e que estejam alinhadas em torno de um propósito comum;

5. A sucessão deve acontecer quando a próxima geração estiver pronta para assumir.

Por muito tempo vimos a geração sênior dizendo “quando eu estiver pronto para sair, vejo quem está pronto para assumir”, e, muitas vezes, esse dia chegava de forma repentina, não havia ninguém preparado ou, ainda, não havia mais ninguém interessado nos negócios, pois a próxima geração cansava de esperar e ia construir seu próprio caminho.

Além desses 5 pontos, é importante reforçar que, seja qual for o caminho escolhido e/ou a posição a ser trabalhada, sucessão é um processo de responsabilidade de toda a família, e, quanto mais clara a comunicação e transparente o processo, maior a chance de preservar as relações familiares e de garantir o sucesso na transição.

(*pesquisa global Next Gen – PWC)


 

Mônica Camargo Tracanella
Consultora Sênior– Cambridge Family Enterprise Group

 

Com mais de 20 anos de experiência em Recursos Humanos, construiu uma trajetória sólida em grandes empresas como Grupo Pão de Açúcar, Pepsico e Sul América Seguros, atuando no desenvolvimento de lideranças e cultura organizacional. Desde 2014, dedica-se ao universo das empresas familiares, com foco na preparação de herdeiros, mediação de conflitos, governança familiar e sucessão. Atuou por quatro anos como Head de Desenvolvimento e Formação no Family Office da Itaúsa, estruturando programas estratégicos para a próxima geração. Mentora de carreira em iniciativas como ONU Mulheres, MentorEla e Aladas, é Coach Executiva certificada internacionalmente pelo Integrated Coaching Institute (ICI) e especialista em Personal Branding. Graduada em Psicologia, possui pós-graduação em Business Administration e certificação em Comitê de Pessoas pelo IBGC. Seu trabalho alia sensibilidade e estratégia para fortalecer lideranças e garantir a continuidade dos negócios familiares.